A crescente utilização de obras literárias para treinar modelos de inteligência artificial está a gerar polémica e litígios nos tribunais. O caso mais recente, nos Estados Unidos, opôs um grupo de escritores à Meta, empresa responsável pelo Facebook e Instagram, acusada de recorrer a livros protegidos por direitos de autor sem autorização. O tribunal rejeitou a queixa, alegando falta de provas de que a tecnológica tivesse ultrapassado os limites do “uso razoável” previsto na legislação norte-americana.
A decisão favorável à Meta não encerra o debate. O juiz alertou para o risco de que o uso massivo de conteúdos protegidos para treinar IA possa prejudicar seriamente os autores, ao permitir a criação de conteúdos concorrentes sem intervenção humana. O caso junta-se a uma série de processos movidos por criadores de várias áreas — literatura, música e artes visuais — contra empresas tecnológicas que recorrem a obras protegidas para alimentar os seus algoritmos.
Também a empresa Anthropic foi recentemente autorizada a usar livros comprados legalmente para treinar os seus modelos de IA, sem precisar de autorização expressa dos autores, reforçando a tendência judicial em torno do “fair use”.
Para Vítor Palmela Fidalgo, advogado da Inventa e docente na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, o momento é crítico. “Os titulares de direitos de autor têm o legítimo interesse de controlar o uso das suas obras e de serem compensados pela sua exploração”, defende. Ainda assim, reconhece que a legislação atual pode permitir exceções: “Nem sempre o uso de obras protegidas por IA será ilegal. Estamos a assistir, em tempo real, à reconfiguração do conceito de autoria na era digital.”
Num setor em rápida evolução, o equilíbrio entre inovação tecnológica e proteção dos criadores continua a ser uma questão jurídica e ética por resolver.