Em entrevista a Bruno Perin para a Revista do Empreendedor, Gustavo Brito, fundador da Growth Store e antigo diretor do Grupo Boticário, explica porque é que a maioria das empresas não consegue extrair valor real da inteligência artificial e o que separa as organizações preparadas das que apenas seguem a tendência.
O choque de mentalidades entre startups e grandes corporações
Gustavo Brito conhece bem os dois mundos. Antes de criar a Growth Store, uma plataforma B2B que está a redesenhar a forma como as empresas contratam tecnologia, foi fundador da GAVB, consultoria de dados e inteligência artificial com mais de 240 especialistas, adquirida pelo Grupo Boticário em 2021. A passagem para o ambiente corporativo, admite, foi um “choque de realidade”.
“Na consultoria, era ‘pensa em grande, começa pequeno e cresce rapidamente’. No Boticário, aprendi a pensar em ‘quartos de século’, não em trimestres. O erro de muitos líderes é querer implementar IA numa grande empresa com a mentalidade de startup — e isso quase sempre termina em frustração”, explica.
Segundo Gustavo, o segredo está em alinhar o ritmo da inovação com a capacidade de absorção da organização. “A IA não é um produto, é um processo orgânico. Crescer rápido, neste contexto, é escalar governança, confiança e cultura”, sublinha.
AI-First ou Data-Driven: o paradoxo que trava a transformação
A ambição de ser AI-first é uma das maiores armadilhas da era digital, alerta o empreendedor. “As empresas investem milhões em ferramentas de IA, mas continuam com dados fragmentados e sem qualidade. É como comprar um Ferrari e abastecer com combustível adulterado.”
Para Gustavo Brito, a solução passa por uma estratégia dual: fortalecer a governança e a integração de dados, enquanto se executam projetos de IA de curto prazo que já gerem valor. “A saída não é desistir da IA, mas equilibrar maratona e sprint: construir a base certa e, em paralelo, mostrar resultados.”
Agentes inteligentes: promessas distantes, fundações urgentes
Apesar do entusiasmo em torno dos “agentes inteligentes”, Gustavo é claro quanto à realidade atual. “Ainda estamos longe do cenário em que a IA toma decisões autónomas com base em dados empresariais limpos e acessíveis. O que existe hoje é um processo intensivo, manual e dependente da qualidade dos dados.”
“O agente mais inteligente do mundo é inútil se não conseguir aceder à informação da empresa. Quem espera um modelo mágico vai chegar atrasado a 2030.”
Por isso, defende que a vantagem competitiva está em investir agora em integração de sistemas, governança de dados e contexto empresarial — os três pilares que permitirão que a IA funcione de forma real e escalável.
A revolução silenciosa e a decisão que define o futuro
Empresas como a Amazon, Microsoft e Google já estão a usar IA para melhorar os seus próprios dados, automatizando a governança e criando uma base sólida antes de expandirem aplicações externas. “A IA pode acelerar a jornada data-driven — mas apenas se começarmos pela fundação”, resume.
A questão que, para Gustavo, definirá o futuro das empresas é simples:
“Preferem investir dois anos a construir dados sólidos para dominar com IA, ou continuar a gastar milhões em projetos que nunca sairão do piloto por falta de base?”
Gustavo Brito é fundador da Growth Store, plataforma B2B que liga empresas e soluções tecnológicas com inteligência, e da Steps to Growth, consultoria especializada em automação e inteligência de crescimento. É também criador da Nosa, comunidade dedicada ao futuro das vendas com automação e IA. A sua missão é construir o maior ecossistema independente de crescimento B2B da América Latina.
