A nova geopolítica da ciência

A ciência num mundo em mutação

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A geopolítica da ciência nunca foi tão complexa. À medida que as tensões internacionais aumentam e a competição por tecnologias críticas se intensifica, a investigação científica deixou de ser apenas um motor de progresso — passou a ser também um campo estratégico. A edição 2025 do relatório da OCDE Science, technologie et innovation : Perspectives de l’OCDE 2025 sublinha que a “securitização” crescente da ciência está a remodelar as colaborações internacionais e a forma como os países definem as suas prioridades tecnológicas.

Num contexto marcado por rivalidades económicas e pela emergência de novas potências tecnológicas, a ciência tornou-se um instrumento de influência global. A questão central já não é apenas quem produz conhecimento, mas quem o controla, protege e aplica em setores críticos — da inteligência artificial à biotecnologia, das neurociências à energia limpa.

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Segurança sem isolamento

Segundo a OCDE, os sistemas públicos de investigação enfrentam um desafio delicado: garantir a segurança da pesquisa sem comprometer a cooperação internacional. Proteger dados sensíveis e reforçar a autonomia estratégica é necessário, mas o isolamento científico pode minar o próprio avanço da inovação. A organização recomenda políticas de segurança proporcionais, calibradas em parceria com a comunidade científica e empresarial, para evitar uma fragmentação da cooperação global.

O relatório destaca que a diplomacia científica deve ser repensada como ferramenta de equilíbrio: promover a soberania tecnológica sem fechar portas ao intercâmbio de ideias. Essa abordagem é particularmente relevante para países de média dimensão científica, como Portugal, que beneficiam da colaboração multilateral e da integração em redes internacionais de conhecimento.

Autonomia tecnológica e alianças seletivas

A “autonomia estratégica” tornou-se uma expressão-chave na política de inovação. Para a OCDE, isso não significa autossuficiência, mas sim a capacidade de desenvolver competências críticas e de escolher parcerias de forma seletiva e inteligente. Em áreas como semicondutores, computação quântica ou biotecnologia, a interdependência é inevitável — mas deve ser gerida com transparência, confiança e partilha de risco.

O relatório defende que os países reforcem as suas capacidades internas de investigação e de absorção tecnológica, sem abandonar o princípio da ciência aberta. O equilíbrio entre competição e cooperação será o verdadeiro teste à resiliência dos sistemas científicos na próxima década.

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Portugal e a nova diplomacia científica

Para Portugal, a transição para esta nova geopolítica da ciência representa tanto um desafio como uma oportunidade. O país tem reforçado a sua integração em programas europeus e criado instrumentos para apoiar a internacionalização da investigação. Contudo, o contexto global exige uma atualização das políticas de diplomacia científica, com maior investimento em áreas críticas e redes que combinem segurança, ética e inovação.

A OCDE alerta que o futuro da ciência dependerá da capacidade dos governos de criar ambientes de confiança entre investigadores, empresas e cidadãos. Num mundo em que a tecnologia é também poder, a verdadeira força dos sistemas científicos residirá na sua abertura — e na forma como conseguem transformar o conhecimento em bem comum.

Fonte:

OCDE (2025), Science, technologie et innovation : Perspectives de l’OCDE 2025 : Conduire le changement dans un monde en mutation, Éditions OCDE, Paris, https://doi.org/10.1787/a7207a31-fr.

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