Num tempo em que a desinformação se espalha mais depressa do que os factos, a confiança pública na ciência tornou-se um ativo estratégico. A OCDE, na edição 2025 do relatório Science, technologie et innovation : Perspectives de l’OCDE 2025, identifica a ciência aberta como uma das chaves para restaurar e fortalecer essa confiança.
A organização alerta que o conhecimento científico só cumpre plenamente a sua função social quando é acessível, transparente e compreensível. Ao abrir os processos de investigação à sociedade — desde os dados até às conclusões —, as instituições científicas não apenas democratizam o saber, mas reforçam a legitimidade do investimento público em I&D.
Liberdade, transparência e responsabilidade
A OCDE enfatiza que a ciência aberta não é um slogan, mas uma prática que exige políticas estruturadas. Os governos devem garantir liberdade de investigação e, simultaneamente, mecanismos de integridade e transparência, de modo a preservar a credibilidade do sistema científico.
Entre as recomendações estão a adoção de repositórios públicos de dados e resultados, o incentivo à publicação em acesso aberto e a promoção de programas de literacia científica junto da população. Estes elementos contribuem para criar uma cultura de transparência e responsabilidade partilhada entre investigadores e cidadãos.
A abertura deve também ser acompanhada de proteção ética e de segurança, especialmente quando envolve dados sensíveis ou tecnologias emergentes. A confiança, lembra a OCDE, nasce da transparência, mas cresce com a responsabilidade.
Participação e ciência cidadã
O relatório propõe uma aproximação mais direta entre ciência e sociedade através de programas de ciência cidadã e iniciativas de comunicação pública da ciência. Envolver os cidadãos no processo de investigação — seja na recolha de dados, na definição de prioridades ou na interpretação de resultados — é uma forma de transformar a curiosidade coletiva em motor de inovação.
Esta participação contribui ainda para alinhar a investigação com os desafios reais das comunidades, reforçando o sentido de pertença e utilidade social da ciência. A OCDE considera que esta abertura bidirecional pode ser determinante para aumentar o impacto e a relevância do conhecimento produzido.
Portugal e a cultura de acesso aberto
Portugal tem sido um dos países pioneiros na Europa na implementação de políticas de acesso aberto à investigação científica. A criação do Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (RCAAP) e a integração nos programas da Comissão Europeia são marcos importantes desse percurso.
Contudo, o relatório da OCDE sugere que é necessário ir mais além: incentivar a comunicação direta entre investigadores e sociedade, integrar a ciência cidadã nas universidades e valorizar a divulgação científica como parte da carreira académica.
A confiança na ciência, conclui a OCDE, é o elo invisível que liga conhecimento e progresso. E a sua construção depende, cada vez mais, de uma ciência que se abre ao mundo — e o convida a participar.
Referência:
OCDE (2025), Science, technologie et innovation : Perspectives de l’OCDE 2025 : Conduire le changement dans un monde en mutation, Éditions OCDE, Paris, https://doi.org/10.1787/a7207a31-fr.