A inteligência artificial tornou-se parte integrante da vida digital em Portugal. O estudo “IA – Impacto e Futuro 2025”, desenvolvido pela Magma Studio em parceria com a CIP e o apoio da DSPA, mostra que 94,8% dos portugueses já utilizaram ferramentas de IA generativa, enquanto 73,1% o fazem semanalmente e 48,2% recorrem a estas tecnologias diariamente. Trata-se da radiografia mais completa até agora sobre a integração da Gen-AI no trabalho, no ensino e na vida pessoal.
A generalização do uso contrasta, no entanto, com a falta de maturidade no plano organizacional. Apenas 30,3% dos inquiridos acredita que a sua empresa utiliza IA generativa de forma estruturada, revelando um atraso entre hábitos individuais e estratégias empresariais. Para a Magma, esta assimetria impede que o país converta o uso intensivo da tecnologia em ganhos reais de produtividade, inovação e competitividade.
O relatório mostra ainda que a normalização da IA convive com uma perceção limitada de risco: 64,7% dos profissionais afirma ter pouca ou nenhuma preocupação sobre a possibilidade de substituição do seu posto de trabalho. A consultora alerta que este sinal pode traduzir confiança, mas também desconhecimento sobre o impacto expectável da tecnologia nos modelos laborais e operacionais.

Capacitação insuficiente compromete o potencial transformador
A formação é identificada como o grande ponto cego da transição digital. De acordo com o estudo, 64,6% dos participantes não realizou qualquer formação em IA generativa no último ano e, entre os que o fizeram, a maioria frequentou apenas ações breves e introdutórias. Este défice formativo favorece o que a Magma designa como “utilizadores superficiais”, com incapacidade para evoluir para usos avançados como automação, agentes autónomos, análise de dados, desenvolvimento assistido ou integração em sistemas empresariais.
Miguel Gonçalves, CEO da Magma Studio, resume o desafio ao afirmar que “a gen-AI faz parte do dia-a-dia dos profissionais portugueses, mas ainda existe um longo caminho na capacitação das pessoas para utilizarem estas tecnologias num nível avançado e realmente transformador”. Para o responsável, a distância entre utilização e domínio técnico poderá tornar-se um dos principais obstáculos à modernização da economia.
A análise mostra igualmente que existe pouca clareza interna nas organizações: cerca de um terço dos profissionais não sabe em que áreas da sua empresa a IA já está a ser aplicada, revelando falhas de comunicação, ausência de governance e inexistência de estratégias transversais.

Padrões de utilização ainda concentrados em tarefas iniciais
Apesar da elevada adesão individual, os casos de uso permanecem nos primeiros níveis de maturidade tecnológica. A criação de conteúdos domina entre os profissionais, seguida da investigação e da ideação. Entre os estudantes, destacam-se a investigação académica, a automatização de tarefas e o brainstorming.
Esta realidade é indicadora de dois fenómenos: a acessibilidade crescente das ferramentas de IA generativa e a falta de evolução para aplicações que produzam ganhos estruturais, designadamente: automação avançada, aumento de eficiência, tomada de decisão baseada em dados ou integração operacional. Para a Magma, o salto qualitativo depende de modelos formativos que combinem competências técnicas, literacia digital e aplicação prática orientada às funções.
Rafael Rocha, diretor-geral da CIP, destaca que “os resultados confirmam a urgência de uma adoção mais estruturada e estratégica da IA. A economia portuguesa precisa de acelerar a sua maturidade digital”. O responsável reforça que a CIP, através da Academia CIP e do movimento AI Nation Portugal, pretende promover uma utilização ética, produtiva e inclusiva destas tecnologias.

O que falta para que Portugal avance para o nível estratégico
O estudo aponta um conjunto de caminhos para que o país consiga transformar a elevada adoção em maturidade avançada. Entre as prioridades, a Magma destaca a criação de programas de requalificação de média e longa duração, com certificações modulares e formação prática orientada a funções específicas. Defende ainda uma estratégia nacional de IA responsável, inspirada nos modelos britânico e alemão, e mecanismos que incentivem as empresas a utilizar IA como complemento ‑ e não substituto ‑ do trabalho humano.
A consultora propõe também um índice anual para monitorizar a evolução da maturidade nacional e um programa público dedicado ao apoio das PME, combinando consultoria subsidiada, kits de casos de uso e formação setorial.
Portugal encontra-se, assim, num ponto intermédio: com um nível de adoção individual entre os mais elevados da Europa, mas ainda distante das competências profundas capazes de gerar transformação organizacional, aumento de produtividade e impacto económico. A convergência entre capacitação, governance e visão estratégica será determinante para que a inteligência artificial deixe de ser apenas uma ferramenta quotidiana e se torne um motor efetivo de competitividade.







