Thiago Cardoso, Diretor de Dados e IA/ML do iFood, explica como a empresa construiu uma vantagem competitiva sistémica através de uma visão de longo prazo sobre a inteligência artificial. Mais do que usar tecnologia, o iFood transformou-a no seu sistema nervoso estratégico, num processo iniciado em 2018 e que hoje define todas as decisões com impacto em milhões de utilizadores.
Sete anos a construir inteligência
A trajetória do iFood na inteligência artificial não começou com modas ou soluções imediatistas. Como lembra Thiago Cardoso, “é muito importante não encarar a IA como imediatismo. O iFood está num processo de IA desde 2018, a trabalhar com machine learning, a perceber o que é IA, o que é machine learning, o que são dados, o que são dashboards. Não é algo novo, mas algo que foi construído propositadamente.”
Em vez de aplicar IA pontualmente, o iFood desenhou um ecossistema amplo e coerente. Mapeou o que é verdadeiramente IA, o que corresponde a machine learning, o que são dashboards ou simples automatizações. Essa clareza conceptual evita desperdícios em “falsa IA” e garante sinergia nos dados, conduzindo a decisões mais robustas. O resultado é palpável: mais de 600 agentes de IA já operam na linha da frente, aumentando o valor entregue aos clientes.

Foco inabalável: a experiência do cliente
Num negócio em rápida expansão — da comida às farmácias, dos supermercados aos benefícios —, manter o rumo é um desafio constante. Para o diretor de IA, a bússola estratégica é clara. “É fundamental perceber os recursos e onde colocar mais energia. A grande ponderação para onde colocar mais energia é usar o direccionador do que vai melhorar a experiência do cliente.”
Enquanto muitos concorrentes se dispersam em oportunidades diversas, o iFood usa um filtro simples e binário: esta iniciativa melhora a experiência do cliente ou não? Se a resposta for negativa, a energia não é investida. A disciplina estratégica baseia-se também no uso de metodologias como os OKR, que permitem manter o foco sem perder a visão de longo prazo.
IA e estratégia: uma união consolidada
A maturidade do iFood, explica Thiago Cardoso, está na forma como integra a IA na própria estrutura de decisão. “É algo já bastante consolidado esta interligação da estratégia e da IA no iFood. É relevante que os executivos percebam mais da IA, dos tipos de IA que existem, como cada uma ajuda. Mas percebendo que a grande decisão é do gestor, e o mais importante é que a IA seja sempre ponderada para a experiência do cliente.”
O ponto crítico, explica, está na capacitação executiva: não basta ter sistemas a funcionar, é necessário que líderes e gestores compreendam os diferentes tipos de IA e como cada um apoia a decisão. Isso cria uma organização onde a liderança pensa com IA, e não apenas sobre IA.

A revolução silenciosa
O modelo do iFood segue o caminho de gigantes como Google, Intel ou Adobe: a IA como sistema nervoso da empresa, e não como ferramenta isolada. Enquanto a maioria das organizações mantém implementações fragmentadas em silos, as empresas de alto desempenho fazem da IA o tecido conectivo entre estratégia, operação e experiência do cliente.
Para Thiago, esta é a diferença entre “usar IA” e “ser potencializado por IA”. No Brasil, o iFood mostra que é possível construir esta maturidade com visão de longo prazo e disciplina estratégica, em vez de esperar por pressões externas. “Todo este movimento de IA inspira imenso. Só que, se as empresas não tiverem uma metodologia clara como OKR — algo que permita perceber o foco de cada momento para saber dar cada passo — vão patinar num universo muito amplo que não chega a lado nenhum.”
O desafio aos concorrentes
Ao transformar a IA no centro da estratégia, o iFood não só ganhou escala como estabeleceu um novo padrão no mercado. Thiago deixa uma provocação que serve de alerta: “Se a IA é o novo sistema nervoso dos negócios, a vossa empresa está a construir inteligência ou apenas a comprar ferramentas?”
Enquanto alguns ainda decidem como avançar, o iFood já leva sete anos de vantagem.