Marta Henriques Pereira: “A diáspora é uma rede viva de talento”

Marta Henriques Pereira defende a diáspora portuguesa qualificada como rede viva de talento, língua e impacto global.

Na foto: Marta Henriques Pereira, jurista e autora do livro Caminhos Globais

Com mais de duas décadas de experiência em organismos internacionais e na União Europeia, Marta Henriques Pereira tem-se destacado na criação de pontes entre Portugal e o mundo. Do podcast e livro Caminhos Globais à Rede de Portugueses nas Organizações Internacionais (RPNU) e à Resposta Luso, a jurista e investigadora defende a valorização da diáspora, a diplomacia cultural e a língua portuguesa como motores de impacto e identidade.

Do Funchal ao mundo

Natural da Madeira, Marta Henriques Pereira iniciou a carreira como advogada antes de integrar missões internacionais em mais de vinte países, entre as Nações Unidas, a União Europeia e parcerias com o governo australiano. Essa experiência moldou a sua visão de Portugal como ponte credível no cenário internacional. “O meu trabalho internacional mostrou-me a relevância da nossa história, da nossa língua e da nossa capacidade de adaptação. Portugal não é apenas um país pequeno e periférico, mas uma ponte credível, capaz de gerar confiança e diálogo.”

Atualmente a viver na Arábia Saudita, onde trabalha no setor corporativo e conclui um doutoramento em resolução alternativa de conflitos, Marta Henriques Pereira concilia projetos de consultoria em diversidade, equidade e inclusão com iniciativas de diplomacia cultural. Resume assim a sua missão: “Portugal tem no seu povo uma rede viva de talento e identidade. A minha missão tem sido ligar esses pontos e dar-lhes voz em contextos internacionais.”

Na foto: Marta Henriques Pereira

Caminhos Globais: o livro e a comunidade

O seu livro, Caminhos Globais, nasceu de um podcast homónimo que recolheu testemunhos de portugueses com carreiras internacionais. Mais do que partilhar trajetórias, a autora quis mostrar padrões comuns de resiliência, disciplina e criatividade que podem inspirar outros profissionais. “Quis mostrar que é possível chegar a estas organizações sem ‘cunhas’ — o que exige preparação, disciplina e sentido de missão. Esses percursos individuais devem ser inspiração coletiva.”

A mesma lógica de partilha está presente na Rede de Portugueses nas Organizações Internacionais e na União Europeia (RPNU), uma organização de que é cofundadora e que apoia candidatos e profissionais através de mentoria, formação e articulação com o Ministério dos Negócios Estrangeiros. Para Marta Henriques Pereira, ainda persistem obstáculos no acesso a estas carreiras. “Faltam apoios estruturados para que os portugueses não fiquem desligados da casa-mãe. Precisamos de políticas mais claras para valorizar a diáspora qualificada.”

Na foto: Marta Henriques Pereira, jurista e autora do livro Caminhos Globais

Resposta Luso: agir no terreno

Se a RPNU tem uma vocação institucional, a Resposta Luso foca-se na prática humanitária. Criada por Marta, esta associação atua sobretudo em países de língua portuguesa, enviando peritos para missões de emergência e desenvolvimento e promovendo formação em diplomacia humanitária e sustentabilidade.

O trabalho parte de uma premissa clara: eficácia e respeito pelas realidades locais. “Sempre procurei juntar a comunidade lusófona. Organizei noites de poesia, fado, almoços e convívios. É uma riqueza de cores e sons que espelha uma identidade linguística e cultural que nos une.”

Um exemplo é a Arábia Saudita, onde o português se tornou a segunda língua mais falada no futebol, atraindo interesse de comunidades não portuguesas. Para Marta Henriques Pereira, este é um sinal do potencial de soft power que Portugal ainda não aproveitou totalmente.

A língua como ativo estratégico

Marta Henriques Pereira insiste que a língua portuguesa deve ser assumida como recurso diferenciador. Apesar de ser a quinta língua mais falada no mundo e a mais utilizada no hemisfério sul, Portugal ainda não possui uma rede robusta de escolas ou centros de cultura no exterior. “Portugal deve ver a língua portuguesa como uma mais-valia estratégica: capaz de potenciar trabalho, negócios e integração social. Onde falar português seja sinónimo de oportunidade, aproximação e futuro.”

A sua defesa da lusofonia como identidade passa também pelo reconhecimento das marcas culturais espalhadas pelo mundo, dos fortes portugueses em África e na Ásia às palavras do vocabulário quotidiano em diversas línguas. No TEDx Funchal, Marta destacou como cultura, tempo, resiliência e identidade podem ser obstáculos à adaptação global — e como a língua comum ajuda a superá-los.

Na foto: Marta Henriques Pereira

Empreender como criar valor social

A experiência internacional também lhe mostrou que a diplomacia cultural pode ser uma oportunidade para o setor privado. Empresas que investem em soft power ganham reputação, expandem redes de contacto e criam contextos mais favoráveis à inovação. Mas para Marta Henriques Pereira, o conceito de empreendedorismo vai muito além do lucro. “Um empreendedor é quem cria valor social. Corre riscos para concretizar uma visão com coragem. Mas, acima de tudo, é alguém orientado para transformar a sociedade e não apenas para gerar lucro.”

É nesta perspetiva que considera os portugueses com carreiras internacionais como verdadeiros empreendedores, pela sua capacidade de inovar e adaptar-se em cenários complexos.

O futuro: presença ética e transformadora

Ao olhar para o futuro, Marta Henriques Pereira acredita que Portugal deve reforçar o seu papel internacional não apenas em número de representantes, mas sobretudo na qualidade da sua presença. Defende uma diplomacia cultural capaz de gerar confiança e cooperação num mundo marcado pela polarização. “A língua, a cultura e a identidade partilhada devem ser motores de aproximação num tempo em que a tecnologia e a inteligência artificial ocupam cada vez mais espaço. É na nossa humanidade que reside a força diferenciadora.”

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