Num contexto de desaceleração global, Clara Albuquerque, da BCG, defende que o setor do luxo precisa de recentrar-se nos clientes de topo — um nicho de 0,1% que gera quase um quarto do valor mundial e será o motor do crescimento até 2030.
O luxo em retração: um mercado entre a exclusividade e a vulnerabilidade
O mercado global de luxo pessoal atravessa um dos períodos mais desafiantes da última década, com uma quebra inédita de 2% no crescimento. A desaceleração afeta sobretudo os consumidores aspiracionais — aqueles que gastam até 5 000 euros anuais em produtos ou experiências de luxo — que foram, durante anos, o motor do setor.
De acordo com o estudo “True-Luxury Global Consumer Insights”, da Boston Consulting Group (BCG) em parceria com a Altagamma, 35% destes consumidores reduziram ou suspenderam as suas compras, redirecionando o consumo para áreas como o bem-estar, a poupança ou o mercado de segunda mão. Metade afirma sentir-se financeiramente vulnerável, o que reduziu a sua quota de mercado para 60%, menos 13 pontos percentuais desde 2013.
Os clientes de topo desafiam a volatilidade
Em contraciclo, os clientes de topo — que gastam mais de 360 mil euros por ano em luxo, ultrapassando os 500 mil euros se incluídas viagens, arte ou automóveis — estão a consolidar a sua relevância estratégica. Apesar de representarem apenas 0,1% do mercado, geram 23% do valor total e mantêm uma intenção de compra otimista: 50% afirmam que vão aumentar os gastos entre 5% e 25% nos próximos 18 meses.
Segundo Clara Albuquerque, Managing Director & Partner da BCG, “as marcas que colocarem o cliente de topo no centro da sua estratégia, criando experiências verdadeiramente personalizadas, baseadas em excelência e confiança, estarão não só a responder às expectativas deste segmento, como também a redefinir o futuro do setor do luxo”.
A análise da BCG mostra que as casas de luxo que apostaram na massificação — com carteiras dominadas por clientes aspiracionais — enfrentam quedas acentuadas nas vendas. Em contrapartida, as marcas que mantiveram a exclusividade e o relacionamento direto com os consumidores de topo estão a prosperar.
A reconfiguração do luxo: da massificação à personalização
O estudo identifica quatro pilares para reconstruir o crescimento do setor:
- Relação humana e personalização: privilegiar o contacto direto e usar a GenAI para gerar insights que reforcem a ligação com cada cliente.
 - Experiências exclusivas: criar momentos memoráveis que traduzam intimidade, autenticidade e pertença.
 - Excelência do produto: reforçar o controlo da cadeia de abastecimento e o valor artesanal do fabrico.
 - Conhecimento de cliente: investir em dados e sistemas de CRM que permitam identificar e compreender os consumidores de topo.
 
Bem-estar e design: o novo luxo
O estudo também destaca as novas áreas de expansão — bem-estar, beleza e design de interiores — que deverão crescer 10% nos próximos 18 meses. Esta tendência, designada health-as-wealth, revela uma mudança de paradigma: o luxo deixa de ser apenas posse e torna-se investimento no equilíbrio, na saúde e no tempo.
O mercado global de luxo entra, assim, num ciclo mais seletivo e exigente. As marcas que quiserem permanecer relevantes terão de fazer o que o luxo sempre soube fazer melhor: servir menos clientes, mas de uma melhor forma.