O impacto no ecossistema português da queda do fundraising europeu

Análise do impacto no ecossistema português perante a quebra de 60% no fundraising de VC na Europa em 2025.

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A queda de 60% no fundraising de capital de risco na Europa em 2025, segundo dados divulgados pela Sifted, levanta questões estruturais para mercados mais pequenos e periféricos. O impacto no ecossistema português deve ser analisado à luz de dois movimentos paralelos: a retração na captação de novos fundos e o crescimento do investimento em startups, especialmente em inteligência artificial. Esta combinação cria um cenário paradoxal, que pode simultaneamente abrir oportunidades e agravar fragilidades do mercado nacional.

A contração do fundraising europeu tende a pressionar sobretudo os países onde a base de investidores institucionais é menos robusta e onde o ecossistema depende, em grande medida, de capitais internacionais. É neste contexto que Portugal surge particularmente exposto. Sempre que os fundos europeus enfrentam ciclos de angariação mais difíceis, tornam-se mais seletivos, priorizando mercados maiores, tickets mais elevados e equipas com histórico comprovado.

Neste cenário, é expectável que o impacto no ecossistema português se manifeste sobretudo nas fases iniciais. Startups em seed e pre-seed, que tradicionalmente já enfrentam maior incerteza e menor liquidez, podem sentir uma redução no número de rondas disponíveis ou um maior rigor nos termos exigidos pelos investidores.

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A força da IA e as oportunidades para hubs emergentes

Apesar da quebra no fundraising, o investimento europeu em startups cresceu em 2025, impulsionado por mega rondas e pela aceleração das tecnologias de IA. Segundo a Sifted, o investimento em startups nativas de inteligência artificial aumentou 140% em relação ao ano anterior, reforçando a tendência de concentração de capital em setores deep tech.

Para Portugal, esta evolução representa um eixo de oportunidade. A presença crescente de centros de desenvolvimento tecnológico e o fluxo de talento internacional permitem ao país posicionar-se como hub intermédio para empresas de IA. Mesmo num cenário de capital mais escasso, áreas de forte crescimento, como computação distribuída, automação inteligente e semicondutores, continuam a atrair investimento sempre que demonstram tração técnica e equipa especializada.

Em termos práticos, este movimento pode suavizar o impacto no ecossistema português nas áreas tecnológicas mais avançadas, desde que existam condições para captar talento e consolidar equipas capazes de competir em escalabilidade.

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O risco da concentração e o efeito “winner-takes-most”

O aumento do investimento no total de capital deployado, apesar de haver menos rondas, indica que o mercado europeu está a concentrar recursos em menos startups. Para Portugal, esta tendência tem duas implicações claras.

A primeira é que empresas que já demonstram maturidade e capacidade de escalar podem beneficiar de uma maior atenção dos investidores, desde que apresentem métricas sólidas e ambições internacionais. A segunda, mais sensível, é que um número elevado de startups poderá enfrentar maior dificuldade em aceder a rondas subsequentes, levando a um aumento da mortalidade nos estágios iniciais.

Este efeito é ampliado quando a retração no fundraising coincide com custos de capital elevados e ciclos macroeconómicos de maior incerteza. O impacto no ecossistema português, neste caso, não se traduz apenas em menos capital disponível, mas na necessidade de modelos de negócio mais resilientes e trajetórias de crescimento mais disciplinadas.

Stand da Startup Portugal na Web Summit 2025 (foto de Empreendedor)

Um ecossistema em crescimento, mas dependente de ciclos externos

A análise estrutural mostra que Portugal permanece vulnerável ao comportamento dos mercados europeus. A dependência de investidores internacionais, um fenómeno natural para um país com mercado interno curto, significa que oscilações no fundraising europeu têm reflexo direto na disponibilidade de capital para empresas nacionais.

Ao mesmo tempo, o dinamismo verificado na Europa em segmentos como IA, biotecnologia ou semicondutores mostra que o mercado continua a valorizar inovação e capacidade técnica, o que beneficia startups portugueses bem posicionadas nestes domínios. O desafio passa por reforçar a capacidade de retenção de talento, captar know-how especializado e consolidar ligações com investidores globais.

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Um novo ciclo, novas exigências

O ano de 2025 demonstra que a Europa continua viva e competitiva na inovação, apesar da redução na captação de novos fundos. Para Portugal, o momento exige estratégia, maior profissionalização nos processos de fundraising e uma leitura fina das áreas em que o país pode realmente diferenciar-se. O impacto no ecossistema português dependerá, em grande medida, da capacidade das startups nacionais ajustarem o ritmo, consolidarem bases financeiras sólidas e aproveitarem os fluxos de capital que continuam a existir, ainda que de forma mais concentrada e competitiva.

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