Só não fazemos o que não queremos

André Leonardo nasceu em Angra do Heroísmo, Ilha Terceira, Açores. Desde muito cedo demonstrou a sua capacidade de iniciativa quando, aos seis anos iniciou o seu primeiro negócio vendendo flores porta-a-porta. nMestre em Gestão pelo ISCTE-IUL, André Leonardo especializou-se em empreendedorismo e criação de empresas, e dedicou-se ao desenvolvimento de projetos para a promoção do empreendedorismo em Portugal e no mundo. Criou o movimento motivacional ‘Be Bold’ e ajudou empreendedores a iniciarem os seus negócios. nPortugal tornou-se demasiado pequeno para os seus sonhos e, inspirado em Fernão Magalhães, decidiu dar a volta ao mundo para encontrar e relatar histórias inspiradoras de pessoas ‘que fazem acontecer’, com o objetivo de mostrar que é possível ir em frente e inspirar os outros com todos estes casos reais. No regresso escreveu a sua experiência em livro. ‘Faz Acontecer’ é lançado hoje (28 de Setembro), pelas 18:30 na Fnac do Centro Comercial Colombo, em Lisboa.

nEmpreendedor.com: – Este livro conta o seu percurso à volta do mundo, mas não é um livro de viagens, pois não?

André Leonardo – Embora o ponto de partida seja de facto uma volta ao mundo, este livro procura sobretudo falar de empreendedores que não viraram a cara à luta. Pessoas que foram em busca de soluções para os obstáculos que lhes iam aparecendo no caminho. Pessoas que fizeram acontecer, alguns nos negócios, outros trabalhando e integrados em empresas, e ainda outros na sua própria vida. Esta é aliás a forma como eu vejo o empreendedorismo: Uma atitude, um estilo de vida. Uma forma de ser e de encarar a vida. nPara mim ser empreendedor é ser alguém que faz acontecer, seja criando a sua empresa e os seus projetos, ou criando valor trabalhando numa empresa, seja até lutando por objetivos pessoais. Este livro é sobre isso e traz-nos casos de empreendedores em todo o mundo, desde Silicon Valley nos EUA à Índia ou ao Quénia.

Empreendedor.com: – E encontrou diferenças entre eles? Ou seja: as diferenças culturais condicionam os empreendedores?

André Leonardo – Existem diferenças enormes. Se na Europa ou América do Norte estamos habituados a ver um empreendedorismo em que se encontram pequenas brechas no mercado – planeia-se e desenvolvem-se planos de negócios e estratégias para melhor ‘atacar’ o mercado – na India, ou em África, vi um empreendedorismo por necessidade. Algo extremo. Um local onde, como costumo dizer ‘ou fazem, ou fazem’, porque se não fizerem acontecer, significa que não vão comer… nPara ter uma ideia, na Índia conheci um rapaz que o que faz para ganhar a vida e colocar comida na mesa é limpar ouvidos no centro de Deli. Ele é limpador ‘profissional’ de ouvidos – e as aspas na palavra profissional são propositadas. Por muito chocante que possa parecer, a verdade é que lá não existem tantos sistemas de apoio para a população, então ele teve de pegar, literalmente, no que tinha à mão e fazer acontecer… São casos quase surreais e muito diferentes do nosso ‘empreendedorismo’ no ocidente mas de onde podemos tirar muitas lições.

Empreendedor.com: – Mas, apesar das diferenças, encontrou pessoas que partilham o mesmo desejo de vencer…

André Leonardo – Exato. Parti para esta viagem porque sentia que as pessoas estavam desmotivadas com toda a situação socioeconómica. Mas mais do que isso, estavam fartas de palavras bonitas e vazias de conteúdo. Senti que tinha de agir e fui à procura de pessoas de carne e osso que tinham feito acontecer, independentemente da sua base de arranque, classe social ou área de intervenção. nPassei por 23 países, falei com 143 empreendedores em países tão diferentes como Tanzânia, Nepal, Austrália, Japão, Brasil ou EUA e, se algo que posso dizer que é transversal a todos eles é que, de facto, todos eles agiram e pensaram como empreendedores. Fizeram acontecer porque não desistiram perante as barreiras que lhes apareciam no caminho. Tiveram força de vontade, trabalharam muito e acreditaram, quando mais ninguém acreditou.

Empreendedor.com: – Há algum exemplo que queira destacar?

André Leonardo – Foi tanta a inspiração que recebi que se torna até difícil para mim destacar um. Mas tendo de escolher, posso falar por exemplo na história de Fernanda Pereira, em Silicon Valley. Nascida no Faial, Açores. Com cinco anos mudou-se para os EUA com a família. Juntamente com o seu marido fundou a Spectrum Lithograph, empresa de impressão e embalagens. Eram jovens e começaram apenas os dois, com mais um empregado e apenas uma máquina de impressão. Hoje, 33 anos depois, a empresa fatura mais de 16 milhões por ano, e já ganharam por duas vezes, os prémios máximos da área. Agora tem quase 60 empregados e uma gama de clientes que inclui a Apple, Safeway ou o American Idol. nPodia contar dezenas de histórias… A grande lição desta volta ao mundo é que, de facto, o difícil é diferente do impossível.

Empreendedor.com: – As dificuldades dos países pobres tornam os empreendedores mais criativos?

André Leonardo – Penso que sim. Aliás, já dizem os antigos que ‘a necessidade aguça o engenho’. Em todo o caso, a verdade é que nos últimos anos, mesmo no ‘nosso’ ocidente, as coisas alteraram-se. Hoje o mundo é inconstante e imprevisível. Temos de lutar pelo que queremos porque, se não o fizermos, ninguém o vai fazer por nós. Essa é a pura das verdades, goste-se ou não. Nada nos vai cair no colo. Por isso, quem quer que sejamos e qualquer que seja o nosso objetivo, temos de começar a pensar e a agir como empreendedores. Como pessoas que lutam pelo que querem, de mangas arregaçadas. Temos de ser criativos, sem truques. E todos temos a capacidade de o fazer!

Empreendedor.com: – Já disse que esta viagem foi uma lição. O que é que aprendeu?

André Leonardo – Aprendi imenso. Depois de um ano pelo mundo voltei cheio de cicatrizes mas também muito mais forte e preparado. Tive a sorte de ver in loco centenas de casos e ver todas estas realidades. São tantas as lições que aprendi, seja com os empreendedores que conheci, seja pelo facto de ter viajado um ano pelo mundo sozinho de mochila às costas. Hoje acredito que nós só não fazemos o que não queremos. O locus de causalidade está muito mais em nós do que nos outros.

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