Uma Agenda Política para a Inovação Social

Startup é inovação e tecnologia

Uma mentira dá a volta inteira ao mundo antes mesmo de a verdade ter oportunidade de se vestir.nWinston Churchill

Ao longo das últimas semanas o Ministro Adjunto e do Desenvolvimento Regional, Poiares Maduro, tem feito, publicamente, várias intervenções sobre o programa Portugal Inovação Social em que esta iniciativa é apresentada como um dos maiores programas da Europa para a promoção da inovação social e, até, um modelo a ser seguido por outros países. Ora, todos sabemos que estão à porta eleições e que, o mais certo, é o Senhor Ministro estar já em campanha eleitoral, mas a verdade não é essa e não podemos deixar de lhe apontar as fragilidades, quer do discurso, quer do próprio programa.

A verdade é que, sem prejuízo da bondade da Equipa de Missão que tem a seu cargo a gestão do Portugal Inovação Social , acerca deste programa ainda sabemos muito pouco. Decorridos mais de seis meses sobre a sua criação ainda não abriram qualquer concurso ou, sequer, publicaram qualquer regulamento ou documentação relevante que permita ao setor da Economia Social e aos actores do mercado de investimento social, prepararem-se e posicionarem-se para aceder aos fundos que aí estarão disponíveis. De facto, o que hoje sabemos sobre as 4 áreas em que se desenvolve este programa, não é mais do que aquilo que ficamos a saber quando, em finais de 2014, foi publicada a Resolução do Conselho de Ministros, que o criou.

Nesta matéria, como em muitas outras, infelizmente, o tempo passou e, de concreto, não temos, ainda, nada. É importante que a Equipa de Missão que gere o programa faça publicar os regulamentos e informação concreta sobre cada uma das 4 áreas em que o programa se desenvolve.

Mas, talvez ainda mais importante do que esta questão da dificuldade no arranque do programa, é estar a criar-se a ilusão de que, com esta iniciativa, todos os nossos problemas sociais encontrarão respostas e que Portugal se colocará na vanguarda da ‘inovação social’. Ora, nada mais falso. Já por várias vezes referi, e não me canso de repetir, que este programa é importante mas que, só por si, fará muito pouco pela inovação social e pela criação do mercado de investimento social. Mais, se não for acompanhado de uma agenda política para a inovação social que contemple várias iniciativas, em vários níveis de intervenção – governo, empresas, instituições da economia social, reguladores, financeiros/bancos – a sua execução corre mesmo o risco de se tornar impossível. É que a inovação social, tal como qualquer outra inovação, requer que se criem as condições adequadas ao seu desenvolvimento e, essas condições, são dadas, em primeira linha, pela existência de uma agenda para a inovação social que seja coerente, com indicação de medidas concretas e um calendário para a sua implementação. Ou seja, com medidas de política dirigidas aos vários atores envolvidos e comprometidos com a inovação social.

Para a criação deste ‘ecossistema de inovação social’, importa que sejam desenvolvidas medidas de política em três níveis ou áreas de intervenção, a saber: (i) Instituições da Economia Social (IPSS, Misericórdias, Mutualidades, etc.) e empreendedores sociais; (ii) mercado de investimento social; (iii) impacto social e regulação.

As medidas dirigidas às instituições da Economia Social e aos empreendedores sociais dizem respeito, desde logo, à criação de condições legais favoráveis à inovação social. A adopção de legislação sobre empresas sociais e negócios sociais, mas, também, a adequação da legislação da IPSS’s a uma nova cultura de sustentabilidade, inovação e qualidade na prestação dos serviços. Criação de mecanismos e capacitação para que as instituições sociais possam adoptar este novo paradigma na prestação do serviço social, focado nos resultados, avaliando o seu sucesso pelos impactos sociais gerados. Apoiar e estimular a criação de incubadoras de inovação social em vários pontos do país e facilitar o seu trabalho em rede. Promover a aproximação entre o conhecimento, produzido em universidades e centros de investigação e as instituições e empreendedores sociais, tornando possível a implementação de inovações sociais e de novas tecnologias sociais.

No âmbito do mercado de investimento social há muitas coisas por fazer, a mais urgente é mesmo a necessidade de um enquadramento legal para as plataformas de financiamento colaborativo, que já atuam em Portugal. É preciso legislar sobre crowdfunding e crowdlending já que é através destas novas plataformas que a esmagadora maioria dos projetos de inovação social se financiam. Mas, também, é importante definir um programa de medidas de incentivo ao investimento social, quer por via fiscal (sob a forma de créditos fiscais), quer pela adopção de outras medidas ativas de estimulo ao investimento social dirigidas a especiais classes de investidores (ex: fundos de investimento, fundações, etc.). Quanto aos Títulos de Impacto Social importa criar legislação de enquadramento tendo em conta as questões que se levantam em termos de contratação pública e a necessidade de garantir a transparência e o pleno acesso de todos os interessados neste tipo de contratos. Os TIS podem ser um importante instrumento para o desenvolvimento e implementação de inovações sociais em vários setores e a vários níveis, nacional, regional e local, mas precisam de estar claramente regulados.

A coordenação, das várias iniciativas e dos vários atores, à escala nacional, deverá estar a cargo de uma agência pública para a inovação social, com a missão de promover a inovação social e o investimento social, assumindo-se a inovação social como uma das componentes centrais das políticas públicas sociais. Caberá a este organismo, entre outras, as seguintes tarefas: (i) promover a adopção de metodologias de avaliação e medição de impacto social; (ii) divulgar informação sobre os custos para o erário público das várias tipologias de problemas sociais (ex.: custo de uma criança obesa para o serviço nacional de saúde), promovendo a cultura de investimento na prevenção social, assim gerando poupança; (iii) desenvolver as medidas necessárias à adopção, por parte do setor público, da avaliação de impacto social na contratualização de serviços de solidariedade social e sociais; (iv) dar suporte técnico à criação de incubadoras de inovação social e suas redes; (v) promover a criação de redes de especialistas em investimento social; (vi) apoiar os organismos da administração central e das autarquias locais na concepção, desenvolvimento e implementação dos seus programas de inovação social; (vii) reunir informação e divulgá-la sobre as melhores práticas em inovação social; (viii) coordenar todos os processos relativos a Títulos de Impacto Social.

Já muito se falou sobre a necessidade de se encontrarem novas formas de financiamento para dar resposta a um número crescente de necessidades sociais e de novas necessidades sociais. Estes novos problemas sociais necessitam de respostas também elas novas e, é por isso, que a adopção de medidas de apoio e estimulo à inovação social são tão importantes e urgentes. Mas não se pense que estes novos instrumentos são a solução para os nossos problemas, eles são, apenas, mais um contributo para a solução.

Ao Estado, nesta como em quase todas as áreas, pede-se que seja um ‘empreendedor social’ inteligente e que não abdique da sua função social, daí que as medidas de política para a inovação social tenham sempre que se enquadrar no quadro mais amplo das políticas públicas para a inovação e das políticas públicas para o emprego e solidariedade.

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