Eduardo Bicacro, Managing Director & Partner da BCG, sintetiza o alerta lançado pelo estudo Consumer Sentiment Survey 2025: a tendência de emigração em Portugal não só se mantém como cresce entre os jovens mais qualificados.
Portugal vive um momento de profunda reflexão sobre o seu futuro demográfico, económico e competitivo. Os dados do Consumer Sentiment Survey 2025, realizado pela Boston Consulting Group, mostram que a tendência de emigração em Portugal permanece elevada e está particularmente concentrada nos jovens com maior qualificação. Trinta e quatro por cento dos portugueses admite estar disposto a emigrar, um aumento face ao ano anterior, e a principal razão invocada, em trinta e sete por cento dos casos, continua a ser a procura de melhores perspetivas profissionais.
A leitura é clara e preocupante. Para Eduardo Bicacro, “não estamos a conseguir sequer abrandar a tendência de emigração das gerações mais novas, sobretudo das pessoas com maior nível de qualificação”. O gestor relaciona este fenómeno com “a gradual perda de competitividade dos salários em Portugal”, um desafio que se torna mais evidente entre profissionais que encontram com facilidade oportunidades noutros mercados.

Os jovens lideram a intenção de saída
O estudo confirma que a disponibilidade para emigrar diminui com a idade, mas volta a registar um aumento significativo entre os mais jovens. Entre os 18 e os 24 anos, a percentagem de inquiridos que pondera sair do país ascende agora a setenta e três por cento, mais nove pontos percentuais do que em 2024. Esta evolução sugere que a base de talento jovem mais qualificado, essencial para o futuro económico do país, está a considerar cada vez mais o estrangeiro como um caminho para progresso, estabilidade e reconhecimento profissional.
Entre os inquiridos com ensino superior, a proporção daqueles que equacionam a emigração é superior (trinta e cinco por cento) face aos que não possuem formação académica (vinte e nove por cento), reforçando a dimensão estrutural do fenómeno.
Quando a decisão de emigrar vai além da remuneração
Embora a remuneração seja um dos fatores centrais, os dados mostram que o tema é mais complexo. Bicacro sublinha que “nem tudo se resume ao salário”. O estudo evidencia que os portugueses valorizam cada vez mais atributos associados a autonomia, equilíbrio e qualidade de vida. A autonomia e responsabilidade são destacadas por vinte e seis por cento dos inquiridos, seguindo-se o equilíbrio entre vida pessoal e profissional (vinte e cinco por cento) e a flexibilidade de horário (vinte e três por cento). Estes fatores, que moldam a forma como o trabalho se integra na vida quotidiana, tornam outros mercados mais atrativos quando Portugal apresenta dificuldades em acompanhá-los.
O ambiente de trabalho saudável e colaborativo, bem como as relações interpessoais, continuam a ser apontados como elementos importantes. Já o propósito, a flexibilidade geográfica e benefícios adicionais registam menor relevância relativa, o que confirma uma mudança de prioridades entre os profissionais portugueses.

Modelos de trabalho: entre a prática e a preferência
Outro sinal do desfasamento entre expectativas e realidade é o modelo de trabalho dominante. Setenta e dois por cento dos portugueses trabalha em regime totalmente presencial, apesar de mais de sessenta por cento desses profissionais preferirem um modelo mais remoto, parcial ou total. O trabalho totalmente remoto é, atualmente, a realidade de apenas dez por cento dos inquiridos, embora continue a ser a preferência de um em cada quatro portugueses, sobretudo até aos 45 anos.
Este desajuste entre preferências e práticas contribui para a perceção de que outros mercados oferecem condições mais alinhadas com as expectativas das gerações ativas — um fator que alimenta a tendência de emigração em Portugal.
Diversidade como eixo decisivo na construção de ambientes atrativos
A diversidade surge também como um aspeto central na avaliação das condições de trabalho. Oitenta por cento dos portugueses considera importante trabalhar em equipas diversas e inclusivas, sendo que dezassete por cento atribui a este fator caráter essencial. Apenas seis por cento revela não lhe dar importância. A valorização crescente de ambientes plurais indica que os profissionais procuram organizações capazes de refletir a complexidade social e cultural do país e, mais uma vez, comparações com mercados exteriores tornam-se inevitáveis.

Prioridades e das pressões que moldam o futuro do talento
Com base num inquérito a mil portugueses realizado em agosto de 2025, o estudo da BCG revela prioridades claras: melhores perspetivas profissionais, maior autonomia, equilíbrio entre vida pessoal e profissional e ambientes de trabalho mais flexíveis e inclusivos. Os dados revelam também uma tensão estrutural entre as aspirações das novas gerações e a capacidade do mercado nacional de lhes responder.
A tendência de emigração em Portugal não deve, por isso, ser lida apenas como um movimento económico, mas como um indicador social profundo, que reflete expectativas não atendidas e ambições não concretizadas. Como sublinha Eduardo Bicacro, a competitividade nacional depende cada vez mais da capacidade de oferecer condições que permitam reter talento, valorizar qualificações e criar trajetórias profissionais sustentáveis.







