Investimento empresarial na Europa resiste à incerteza e redefine prioridades

O investimento empresarial na Europa mantém-se forte apesar da incerteza, segundo dados do BEI, com foco crescente em resiliência, IA e transição climática.

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A economia europeia atravessa um dos períodos mais complexos das últimas décadas, marcado por tensões geopolíticas, fragmentação do comércio global, aceleração tecnológica e pressão climática. Ainda assim, os dados mais recentes do EIB Investment Survey 2025, do Banco Europeu de Investimento, revelam um sinal estrutural relevante: 86% das empresas europeias continuam a planear investir. Mais do que um indicador conjuntural, este dado ajuda a compreender como o tecido empresarial europeu está a adaptar-se a um novo normal de incerteza prolongada.

A incerteza deixou de ser exceção e passou a contexto

Ao contrário de crises anteriores, a atual combinação de riscos , como a guerra na Ucrânia, instabilidade geopolítica, subida dos custos de financiamento e tensões comerciais, não provocou uma retração generalizada do investimento. O estudo do BEI sugere que as empresas passaram a incorporar a incerteza como variável permanente, ajustando o perfil do investimento em vez de o suspender.

Este comportamento traduz-se numa maior seletividade. O investimento empresarial na Europa é hoje menos orientado para expansão rápida e mais focado em reforço de eficiência, resiliência operacional e adaptação estrutural. Em vez de apostar em crescimento extensivo, muitas empresas privilegiam projetos que reduzam vulnerabilidades futuras, nomeadamente ao nível da energia, da digitalização e da organização do trabalho.

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Inteligência artificial: ambição política, adoção desigual

A inteligência artificial surge no estudo como uma prioridade crescente, mas com ritmos de adoção muito distintos. As grandes empresas avançam mais rapidamente, enquanto as PME enfrentam constrangimentos financeiros, técnicos e de talento que dificultam a transformação da tecnologia em ganhos reais de produtividade.

Este retrato contrasta com o discurso político europeu, cada vez mais centrado em estratégias de soberania tecnológica e em grandes infraestruturas de computação avançada. Os dados do BEI sugerem que o desafio não está apenas em criar capacidade tecnológica, mas em garantir que o investimento empresarial na Europa consegue absorver essa tecnologia de forma transversal, evitando o aprofundamento de clivagens entre empresas líderes e o restante tecido económico.

Transição climática: consenso estratégico, execução assimétrica

A transição energética e climática é outro eixo central das decisões de investimento. O estudo confirma que a maioria das empresas já integra objetivos climáticos nas suas estratégias, muitas vezes impulsionadas por custos energéticos, enquadramento regulatório e exigências dos mercados financeiros.

No entanto, a execução permanece desigual. Empresas de maior dimensão e com melhor acesso a financiamento conseguem avançar mais rapidamente, enquanto muitas PME reconhecem dificuldades em financiar projetos verdes ou em avaliar o retorno económico desses investimentos. Este desequilíbrio coloca desafios adicionais à competitividade europeia, num contexto em que a sustentabilidade deixou de ser apenas uma opção reputacional para se tornar um fator estrutural de mercado.

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Comércio global e fragmentação: decisões antes da política

Um dos aspetos mais relevantes do EIB Investment Survey é a forma como as empresas antecipam a fragmentação do comércio global. Mesmo antes de decisões políticas definitivas, muitas organizações já ajustam cadeias de valor, diversificam fornecedores e reduzem dependências externas críticas.

Este comportamento revela que o investimento empresarial na Europa está a ser orientado por uma leitura pragmática do contexto internacional, onde tarifas, restrições comerciais e riscos geopolíticos são encarados como fatores duradouros. A estratégia empresarial parece, neste caso, avançar mais depressa do que a coordenação política, reforçando a importância de políticas industriais e financeiras alinhadas com esta realidade.

Investir para resistir, não apenas para crescer

O principal contributo do estudo do BEI não está numa previsão otimista ou pessimista, mas numa constatação estrutural: o investimento empresarial na Europa não desapareceu, transformou-se. As empresas continuam a investir, mas fazem-no com objetivos diferentes, mais defensivos e estratégicos, procurando proteger margens, assegurar continuidade operacional e ganhar flexibilidade num ambiente volátil.

Esta mudança de perfil ajuda a explicar por que razão a economia europeia mostra sinais simultâneos de resiliência e fragilidade. A capacidade de investimento mantém-se, mas o seu impacto no crescimento agregado pode ser mais gradual e desigual. Para decisores, investidores e gestores, o desafio passa agora por alinhar financiamento, políticas públicas e estratégia empresarial com esta nova lógica de investimento orientado para a resiliência.

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