
Daniel Ardito, investigador na área de Estratégia Empresarial, explica a Bisociação, o conceito que liga mundos distintos para produzir o novo. “A bisociação é o gesto criativo que transforma a separação em invenção.”
Quantas ideias inovadoras já foram sufocadas antes mesmo de verem a luz do dia? Em ambientes empresariais e startups, a procura do consenso e da harmonia pode ser mais perigosa do que parece: ameaça precisamente o combustível que move a inovação — a capacidade de conectar mundos diferentes, que pode ser o verdadeiro motor das novas ideias.
Arthur Koestler, no clássico The Act of Creation (1964), chamou a essa habilidade bisociação. Diferente da simples associação de ideias próximas, bisociar é cruzar domínios distantes para criar algo totalmente novo. É o que acontece, por exemplo, quando alguém combina o conceito de alojamento com o de rede social e inventa o Airbnb. Ou quando o ato de chamar um táxi se funde com a tecnologia de geolocalização para criar a Uber. Grandes negócios nascem de grandes cruzamentos. Neste sentido, a bisociação pode ser vista como o motor criativo da “destruição criativa” proposta por Schumpeter — o processo pelo qual o novo irrompe ao desestabilizar o velho, substituindo estruturas existentes por combinações inovadoras que redesenham mercados inteiros.

No mundo do empreendedorismo, a bisociação é mais do que uma ferramenta criativa: é uma vantagem competitiva. Quem vê ligações onde outros veem separações consegue identificar oportunidades que ainda não foram mapeadas — ou melhor, consegue criá-las. Num ambiente cada vez mais saturado de produtos semelhantes, a verdadeira inovação exige a coragem de misturar o improvável.
Mas existe um inimigo silencioso que pode minar essa capacidade: o pensamento de grupo, ou groupthink. Segundo Irving Janis (1972), o groupthink ocorre quando o desejo de manter a coesão do grupo supera o incentivo à diversidade de opiniões. É quando todos começam a pensar da mesma forma, não porque chegaram às mesmas conclusões por caminhos diferentes, mas porque têm medo de destoar. Assim começa um processo de sabotagem da criatividade.
Empreendedores que se rodeiam apenas de pessoas que concordam com as suas ideias correm um risco sério: as suas decisões deixam de ser desafiadas, as suas suposições não são testadas e as oportunidades de bisociar novas ideias diminuem drasticamente. O que deveria ser um ambiente fértil para combinações criativas transforma-se numa zona de conforto mental.

Para proteger a capacidade de bisociar — e, portanto, de inovar — é fundamental cultivar a diversidade de perspectivas. Isso significa valorizar opiniões divergentes, procurar conselhos fora da bolha habitual e, sobretudo, criar um ambiente onde o confronto saudável de ideias seja não apenas permitido, mas incentivado. Exercitar o “advogado do diabo”, ouvir quem pensa de forma diferente e explorar campos de conhecimento fora do seu sector são práticas que ampliam o repertório mental necessário para grandes bisociações.
No final de contas, a pergunta que todo o empreendedor deveria fazer não é apenas “o que estou a criar?”, mas também “com quem estou a pensar?”. Ideias verdadeiramente transformadoras exigem uma mente aberta a combinações inusitadas e a coragem de enfrentar o desconforto de pensar diferente.
O futuro dos negócios pertence a quem consegue bisociar — e escapar às armadilhas invisíveis do pensamento de grupo.