João Baptista Leite: “Crise é oportunidade para as empresas investirem na competitividade”

João Baptista Leite, CEO UNICRE

A atual crise económica e geopolítica, bem como os estrangulamentos energéticos e a persistente pandemia, apontam um ano de desafios para as empresas e consumidores. Em entrevista ao Empreendedor, João Baptista Leite, Presidente e CEO da UNICRE, considera, no entanto, que estes desafios são oportunidades de mudança.

O responsável pela instituição financeira portuguesa que opera na gestão e de serviços de pagamento e de crédito, alerta para a necessidade das empresas repensarem os seus modelos de negócio e de gestão, com a ambição de tornarem mais competitivas.

Também para os consumidores 2023 será marcado pela perda de rendimento das famílias e a consequente retração do consumo, pelo que será necessário que os consumidores estejam atentos à gestão do seu orçamento mensal e criem um fundo de emergência.  

No entanto, para João Baptista Leite, existem boas perspetivas no horizonte: as previsões do Banco de Portugal estimam que a economia nacional irá conseguir evitar a recessão. O CEO da UNICRE destaca ainda os sinais positivos, com o crescimento na faturação dos negócios durante as vendas no último trimestre de 2022.

Com uma carreira de mais de 45 anos em diferentes instituições financeiras, João Baptista Leite é Presidente e CEO da UNICRE desde fevereiro de 2019. A nível académico, é licenciado em Computer Programming Technology, na Control Data Institute em Toronto, Canadá. Tem ainda uma certificação em General Insurance, pela Insurance Institute of Ontario e formação em Accounting/Business Finance na York University, ambas em Toronto.

Crise gera necessidade de empresas repensarem modelos de gestão

Empreendedor – Uma sucessão de crises empurrou a economia global para momentos de incerteza nunca vistos e que atingem mesmo países que antes pareciam imunes a crises económicas. Como vê a situação atual globalmente e, em particular, em Portugal?

João Baptista Leite – Tanto a nível global, como, particularmente, em Portugal, acredito que vamos ter um 2023 bastante desafiante, seja para a economia – em que vamos assistir a um abrandamento do crescimento – como para as empresas. No entanto, considero que todas as situações devem ser encaradas como oportunidades de mudança e, inclusivamente, de aprendizagem.

Por um lado, vamos assistir, durante este ano, a um maior aglomerado de fundos comunitários, com o objetivo de potenciar o crescimento do nosso país, seja através, por exemplo, do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), do Portugal 2020 ou do Portugal 2030, que vão impulsionar novas oportunidades de investimento e desenvolvimento, tanto no país, como no setor empresarial (público e privado).

Paralelamente, as consequências da pandemia; do conflito entre a Rússia e a Ucrânia; e por sua vez do contexto inflacionário, trouxeram às empresas a necessidade de repensarem os seus modelos de negócio e de gestão, apostando cada vez mais na inovação e na sustentabilidade, assim como no maior bem-estar dos seus colaboradores.

O cenário atual “obriga-nos”, ainda, a olhar para o horizonte com a ambição de tornar as empresas e a economia nacional mais competitivas e fazer crescer o país no seguimento desse processo, apostando quer nas mudanças já referidas anteriormente, quer no reforço daquilo que já nos acresce valor face à concorrência, desde logo a proximidade e o conhecimento da realidade portuguesa.

Hábitos de consumo digitais reforçam resiliência das famílias

João Baptista Leite, CEO UNICRE

Emp – Na sua área de negócio, como perspetiva o futuro, em especial o próximo ano?

JBL – Ao longo deste ano o setor financeiro será, efetivamente, impactado pela inflação. Com o aumento generalizado dos preços, o Banco Central Europeu, em resposta a este cenário, voltou a subir as taxas de juros. Como consequência deste aumento, estamos a assistir a uma evolução das taxas Euribor, que agravam os encargos das famílias com os créditos habitação.

Para além disso, a perda de rendimento das famílias poderá significar alguma retração do consumo com possível impacto na aquisição de soluções de crédito, como o crédito ao consumo – contrastando com o aumento da adesão a soluções de poupança, sobretudo as de baixo risco, como os certificados de aforro.

No entanto, existem boas perspetivas no horizonte: desde logo a previsão do Banco de Portugal que indica que – apesar do crescimento económico ser mais lento nos próximos dois anos – Portugal irá conseguir evitar a recessão.

Também o comportamento de consumo dos portugueses, no atual contexto de inflação, pode traçar alguma resiliência das famílias em preservar os hábitos de consumo digitais, adquiridos nos últimos anos – vimos, por exemplo, segundo o REDUNIQ Insights, que a faturação dos negócios cresceu 11% na Black Friday e Cyber Monday face ao período homólogo de 2021.

Já para o turismo, existe a expectativa de que 2023 seja ainda um ano de resiliência – com abrandamento, mas continuaremos a crescer, o que permitirá também o nosso crescimento nas soluções de pagamento que disponibilizamos aos nossos Clientes.

Exigir mais rigor e rapidez nos financiamentos da UE

João Baptista Leite, CEO UNICRE

Falta um planeamento fiscal mais estável

Emp – Na sua opinião, que medidas deveriam ser tomadas pelos órgãos de decisão, no sentido de antecipar e minimizar esses riscos?

JBL – Olhar para aquilo que está a ser feito e confirmar se está, efetivamente, a ser bem feito. Referi, anteriormente, alguns exemplos de fundos comunitários que já estão em marcha e que têm como objetivo potenciar o crescimento e desenvolvimento do nosso país, como o PRR, o Portugal 2020 ou o Portugal 2030.

Tendo por base esses três exemplos, mas, particularmente, o PRR, o Banco de Portugal revelou, recentemente, que a quase totalidade das empresas que beneficiam deste programa são PMEs e existe uma elevada dispersão na magnitude dos projetos financiados – são financiados, em média, com 11 milhões de euros, no caso das grandes empresas, e 90 mil euros no caso das microempresas. Assim, será necessário garantir o equilíbrio na aplicação dos fundos e garantir que este financiamento chega às empresas com a celeridade necessária para conseguirem encarar e ultrapassar este momento de incerteza económica.

Adicionalmente, podemos também referir, como uma medida a longo prazo, a implementação de um planeamento fiscal mais estável, uma ferramenta de gestão que pode levar à redução da carga fiscal e, consequentemente, à criação de valor para as empresas.

É unanime, entre as empresas, a complexidade dos procedimentos que estas enfrentam para conseguirem cumprir com as suas obrigações fiscais. Neste sentido, além da aposta nesta ferramenta de gestão, que irá permitir planear, gerir e colmatar as incertezas quanto ao saque fiscal, importa também adotar uma estratégia de comunicação clara, seja sobre as alterações nos prazos, processos, exceções ou, por exemplo, isenções.

Emp – Como devem agir os empresários e consumidores?

JBL – Este ano será particularmente impactado pela inflação, não atingindo, apenas, o setor financeiro, mas praticamente todos os setores. Uma vez que não está ao alcance – pelo menos direto – dos empresários, ou dos próprios consumidores, reverter esta situação. Diria que, no caso das empresas, devem encarar a situação como uma oportunidade para investirem no crescimento, apostando na inovação ou, por exemplo, na própria qualificação dos colaboradores para fazerem face aos vários riscos inerentes ao cenário atual – conflito na Ucrânia, inflação ou disrupção das cadeias de abastecimento.

No entanto, e uma vez que estamos a falar de um país em que as micro e pequenas empresas representam mais de 90% do tecido empresarial, vai ser particularmente importante existir uma atuação firme no que diz respeito à promoção do crescimento destas empresas para conseguirmos posicionar Portugal como um país competitivo lá fora, realidade para a qual a execução dos fundos europeus terá um papel crucial.

Adicionalmente, no caso dos consumidores, estes devem pensar em soluções que permitam fazer uma melhor gestão do dinheiro, como o planeamento do orçamento mensal, uma ferramenta fundamental para conseguirem perceber onde estão a gastar mais dinheiro e como podem ajustar consoante as necessidades de cada mês.

Criar um fundo de emergência é, também, uma solução à qual podem recorrer em caso de contratempo financeiro, ou até adotar um serviço de domiciliação de pagamentos, assegurando que não falham nenhum prazo nos pagamentos das faturas e sofram com as consequências. Podem, ainda, estar atentos a oportunidades que permitam otimizar dinheiro, seja através de campanhas promocionais, como os saldos de verão, inverno ou Black Friday, da subscrição a cartões ou apps de descontos dos supermercados.

Consumidores precisam de estar atentos a oportunidades que permitam otimizar dinheiro

Emp – Por fim, que soluções ou serviços a UNICRE está a desenvolver para enfrentar esses desafios?

JBL – Na UNICRE, e enquanto instituição financeira, teremos sempre a responsabilidade de garantir uma experiência e um acompanhamento de excelência para com os nossos clientes, através das nossas soluções. Apesar de não podermos agir sobre a inflação, disponibilizamos ferramentas como, por exemplo, o crédito consolidado, um instrumento financeiro que permite aos consumidores juntar vários créditos num só, com condições mais vantajosas e uma única mensalidade, que ajudam a diminuir o impacto para o consumidor. Em suma, trazemos valor acrescentado aos nossos serviços pela proximidade, o que nos possibilita obter um conhecimento da realidade nacional e local, que nos permite ter soluções adaptadas ao contexto dos negócios portugueses.

Paralelamente, agimos, também, numa vertente mais preventiva, através da aposta na comunicação, sendo que utilizamos as nossas redes sociais para promover a democratização da literacia financeira.

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